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A suspensão de pagamento de uma dívida fez a administradora de cartões de crédito Credz entrar em uma espiral de problemas que coloca em risco outros títulos emitidos pela empresa. Agora, ela se vê em uma encruzilhada, justamente no momento em que negocia uma aquisição.
Tudo começou quando a Credz, criada em 2011, anos após a família Zogbi vender o banco que detinha para o Bradesco, deixou de honrar um pagamento de R$ 82 milhões ao banco BV, referente a uma nota comercial.
Diante do atraso, o BV entrou com uma ação de execução contra a Credz em setembro, o que acabou afetando também investidores de debêntures emitidas pela empresa.
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A Vórtx, agente fiduciário das debêntures CRED13, CRED14 e CRED15, comunicou em fato relevante na última semana que o ajuizamento da ação de execução pelo BV poderia levar ao vencimento antecipado dos títulos, a depender do que estivesse previsto na escritura de emissão dos papéis.
Quando um título tem vencimento antecipado, o saldo da dívida deixa de ser corrigido apenas pela remuneração prometida pelo emissor da debênture e o juro pelo atraso no pagamento começa a ser contabilizado. No entanto, o título tende a sofrer desvalorização no mercado secundário, causando prejuízo aos investidores.
Tal medida pode ser tomada quando a emissora deixa de cumprir determinadas obrigações estabelecidas em contrato. A debênture CRED13 é a mais curta das três, com vencimento já no fim do ano. As demais debêntures têm prazo até março de 2026. Todos os títulos são voltados para investidores profissionais (com pelo menos R$ 10 milhões em aplicações financeiras).
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Walter Xavier da Cunha Filho, do escritório Walter Cunha Advogados, que analisou o fato relevante e a escritura das debêntures a pedido da reportagem, diz que uma cláusula prevê a possibilidade de vencimento antecipado dos papéis em caso de inadimplência de qualquer dívida ou obrigação da emissora igual ou superior a R$ 15 milhões no mercado de capitais – o que seria o caso da nota comercial em posse do BV.
Diante do imbróglio, a Vórtx informou que está adotando providências para convocar Assembleia Geral de debenturistas e deliberar sobre o vencimento da emissão, além de outras medidas necessárias à proteção dos detentores dos títulos. Procurada pelo InfoMoney, a Vórtx disse que não se pronunciará sobre o assunto.
Agora, Credz e BV tentarão chegar a um acordo em até 180 dias. Na última sexta-feira (29), o banco pediu a suspensão da ação de execução contra a empresa. O caso tramita na 33ª Vara Cível de Execução do Foro Central de São Paulo.
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Problemas geram dúvida sobre FIDC, mas rating não será rebaixado, diz Fitch
As preocupações sobre os desdobramentos do calote da Credz na nota comercial não envolvem apenas as debêntures. Havia o receio de que o problema respingasse também em um FIDC (fundo de investimento em direito creditório) que investe exclusivamente em recebíveis originados entre a Credz e os titulares de cartões da empresa.
O temor era de que o caso levasse a um downgrade (rebaixamento) do fundo, o que poderia piorar a situação da Credz. Relatório da empresa referente a 2022 indica que a carteira total da Credz chegou a R$ 3,1 milhões, sendo que R$ 3,0 bilhões eram créditos cedidos ao FIDC Credz.
O fundo tem patrimônio líquido de R$ 1,59 bilhão. A parte da carteira que investe em direitos creditórios soma R$ 1,53 bilhão, segundo dados da Uqbar compilados a pedido do InfoMoney. Ao todo, são 737 cotistas, sendo alguns representados por fundos de crédito.
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O FIDC possui uma cláusula que trata de eventuais downgrades – e um rebaixamento mais forte poderia levar à aceleração do processo de amortização. Assim, segundo uma fonte ouvida pelo InfoMoney, se o fundo tivesse de aumentar o valor do fluxo mensal usado para amortizar as cotas em função dessa cláusula, o fluxo de caixa da Credz – já apertado – poderia piorar.
Atualmente, as cotas sênior do fundo – as de menor risco – possuem rating AA, segundo a agência S&P. Já as cotas mezanino possuem classificação BBB -, de acordo com a Fitch Ratings.
Nesta terça-feira (3), no entanto, a Fitch Ratings informou que a suspensão de pagamento de juros e do principal das dívidas bancárias da Credz não afetará os ratings do FIDC Credz.
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No documento, a agência disse que a dependência do FIDC em relação à originadora está “adequadamente mitigada”, pois a transação conta com a Fidelity Processadora S.A. como processadora independente e backup servicer. Além disso, diz a Fitch, a Credz opera sob a bandeira Visa.
“Esses fatores são suficientes para endereçar a exposição proveniente do relacionamento entre a Credz e os originadores no que tange seu papel como agente de cobrança. Portanto, uma eventual deterioração da capacidade financeira da Credz possivelmente teria impacto limitado sobre a inadimplência dos direitos creditórios”, observa a agência.
A Fitch informou também que não identificou alterações significativas nos processos de originação e cobrança do FIDC. “Portanto, a suspensão de pagamentos não deve impactar o desempenho do portfólio cedido. Contudo, caso ocorram alterações, os ratings serão revisados”.
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DM Card negocia compra da Credz
Especialistas acreditam que há interesse de todas as partes em manter o FIDC Credz em bom funcionamento. Isso é importante para que a Credz dê outro passo para se consolidar no setor.
Fontes ouvidas pelo InfoMoney confirmam que a administradora de cartões DM Card está em negociações encaminhadas para comprar a Credz, conforme adiantado pelo site NeoFeed.
Em abril deste ano, a DM Card adquiriu a FortBrasil, que possui forte atuação em cartões de loja (private label). A aquisição foi de 49,99% da empresa, podendo atingir 100% futuramente.
A reportagem entrou em contato com a Credz, mas a companhia não confirmou a informação. A reportagem não conseguiu contato com a DM Card.
O movimento de consolidação de administradoras não é à toa e busca tornar o negócio mais escalável, além de ajudar a diminuir os custos de captação, lembra uma fonte.
A compra também seria reflexo de um cenário mais delicado para o mercado de cartão de crédito, que sofreu nos últimos meses após um aumento na inadimplência e do custo de captação.
“As margens e as rentabilidades das empresas estão menores. As companhias estão num cenário de maior estresse do que há três ou quatro anos”, observa o profissional.