Mesmo se aderir a programa do governo, Shein mantém vantagem sobre varejistas

Segundo estudo da SFA Investimentos, com cobrança de ICMS, preços da Shein ainda podem ser 50% menores do que os da Renner

Lucinda Pinto

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A adesão da Shein às novas regras aduaneiras propostas pelo governo não será suficiente, nem de longe, para reduzir a grande vantagem que a companhia asiática tem em termos de preço no mercado local. Segundo estudo elaborado pela gestora SFA Investimentos, mesmo com a incidência de uma alíquota de 17% do ICMS, previstos para as empresas que aderirem ao programa Remessa Conforme, os preços praticados pela Shein seguem muito abaixo dos cobrados por players locais. “O programa pode elevar um pouco a arrecadação, mas não ataca a questão da isonomia fiscal, que é fundamental para a competitividade dos lojistas brasileiros”, explica Ricardo Borges, sócio e analista de ações da SFA.

Para avaliar o efeito fiscal para a competitividade de lojistas locais, a SFA fez um levantamento de preços de mais de 8 mil produtos vendidos tanto pela Shein quanto pelas Lojas Renner (LREN3) no mês de fevereiro – empresa na qual a SFA tem posição e que é afetada de forma direta pela concorrência de produtos de vestuário vendidos pela Shein. A equipe da gestora buscou a comparação de produtos com a maior semelhança possível nos sites das duas empresas e os organizou por categoria, calculando uma mediana dos valores desses itens.

Nas condições atuais, em que os produtos importados pela Shein de até US$ 50,00 chegam ao consumidor sem a incidência de qualquer imposto, os preços são pelo menos 50% menores do que os cobrados pela Renner. Um dos itens pesquisados é o blazer, cuja mediana de preço dos diferentes modelos oferecidos no site da lojista brasileira é de R$ 279,90 e, na asiática, de R$ 97,99 – uma diferença de 65%, portanto. Se a Shein aderir ao programa do governo, a diferença de preço diminui para 57,8%, o que não é suficiente para equilibrar as condições de concorrência.

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Outros exemplos são blusa cropped, cujo preço cobrado pela Shein é 54,7% menor do que o da Renner; camiseta feminina básica branca, 57,6% inferior; e vestido básico de algodão, 61,1%. Com a cobrança do ICMS, prevista no Remessa Conforme, as diferenças seriam reduzidas para 45,5%, 48,9% e 53,9%, respectivamente. Vale reforçar que, em todos os casos, estão sendo comparadas as medianas dos preços de cada um dos itens.

Segundo relatório do Itaú BBA, vendas da Shein desaceleram nos dois primeiros meses de 2023.
Shein: empresa segue com maior atratividade de preços, a despeito de movimentação do governo (Divulgação)

Borges lembra ainda que, ao longo dos últimos anos, a Shein ganhou muito mercado no Brasil e as empresas locais defenderam a afirmação de que, se houvesse tributação, os preços estariam mais equilibrados. Mas, para isso, seria preciso que, além do ICMS, as estrangeiras passassem a recolher também o Imposto de Importação.

Segundo o levantamento, caso o governo implementasse a medida que chegou a ser considerada no início do ano de taxação de 60% de Imposto de Importação, cerca de 18% de ICMS além do despacho postal, alguns dos produtos da Renner ficariam até mais baratos do que os da Shein. De modo geral, a diferença de preços entre as lojistas locais e as estrangeiras ficaria mais equilibrada, tornando o ambiente competitivo mais justo, na visão de Borges.

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Nesse cenário, a mediana dos preços do blazer da Shein ficaria ainda 27,2% menor do que a da Renner. Mas a blusa cropped ficaria 2,3% mais cara do que a da lojista brasileira; a camiseta da Shein custaria 5,3% a mais do que a da Renner, enquanto o preço do vestido de algodão teria uma diferença a menor de preço de 18,8% ante a Renner.

Nesse ambiente, os lojistas brasileiros teriam mais poder de competição, uma vez que há outras variáveis importantes a serem consideradas, como a rede de lojas físicas – que facilita tanto a verificação do produto quanto a troca –, a agilidade nos prazos de entrega, a qualidade de alguns produtos e o atendimento de vendedores. “O preço não é a única variável que define a competitividade de um lojista, mas em um ambiente em que a diferença é gritante, isso acaba limitando o efeito dos outros aspectos”, explica.

A escolha da Renner para a realização do estudo ocorreu porque a SFA investe na companhia há anos, mas é possível dizer que esse efeito é parecido em lojistas com o mesmo perfil, como C&A (CEAB3) e Riachuelo (GUAR3), diz Borges. Esse impacto negativo levou a SFA a reduzir sua posição em Renner ao menor nível histórico. Mas, para Ricardo Borges, uma correção desse desequilíbrio representaria um fator de upside grande para a ação, mais expressivo até mesmo que a queda da taxa de juros que se avizinha. “A queda dos juros tem um efeito imediato sobre o valuation das lojistas, mas acredito que o problema fiscal é hoje uma questão ainda mais relevante”, diz.

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Por fim, o analista explica ainda que outra fonte de preocupação neste momento é que o programa criado pelo governo acabe abrindo as portas para que essa desvantagem fiscal enfrentada pelos lojistas brasileiros acabe extrapolando para diversos outros segmentos. Isso porque, com o Remessa Conforme, qualquer produto, e não apenas os de vestuário, de até US$ 50,00 poderá contar com a isenção do Imposto de Importação, podendo pressionar varejistas como Magazine Luiza (MGLU3) e Via ([ativo=VIIA4]), por exemplo.

Lucinda Pinto

Editora-assistente do Broadcast, da Agência Estado por 11 anos. Em 2010, foi para o Valor Econômico, onde ocupou as funções de editora assistente de Finanças, editora do Valor PRO e repórter especial.