Pérsio Arida critica direcionamento econômico do início do governo Lula

Em entrevista ao Valor Econômico, economista diz estar preocupado com retrocessos em reformas e críticas ao presidente do BC

Roberto de Lira

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O economista Pérsio Arida disse estar preocupado com o direcionamento econômico do governo neste início de mandato do presidente Luiz Inacio Lula da Silva. Em entrevista ao jornal Valor Econômico, ele criticou, por exemplo, a revisão do marco do saneamento básico, a intenção declarada de alterar o regime de metas de inflação, os ataques ao presidente do Banco Central e a volta da política de subsídios do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), evidenciada ontem com o anúncio do pacote de estímulos para a indústria automotiva.

Ele também citou falhas recentes no posicionamento na política externa, após Lula ter feito elogios públicos ao ditador venezuelano Nicolás Maduro e também colocou na lista o risco de retrocessos na pauta ambiental.

Arida afirmou que essas críticas não mudam sua avaliação sobre o apoio pessoal dado a Lula nas eleições contra a reeleição de Jair Bolsonaro, que foi motivado mais pela defesa da democracia, dos direitos humanos e da agenda ambiental do que pela economia.

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“Mas esse começo de governo é uma sequência de iniciativas e ideias que vão na contramão do que o Brasil precisa: a revisão do marco do saneamento, a revisão dos critérios de voto da Eletrobras, os ataques ao Banco Central, os questionamentos sobre a lei das estatais, a volta de subsídios no BNDES, ideias como criar uma indústria de semiprocessadores no Brasil ou restaurar a indústria naval, o subsídio ao carro popular, retrocessos na agenda ambiental”, queixou-se na entrevista.

Ele também alerta para o risco de credibilidade do regime de metas de inflação caso seja feita uma mudança, como elevar a taxa, atualmente em 3%. O economista diz que mesmo uma alteração no sentido de adotar um horizonte mais dilatado, diferente do ano calendário pode ser arriscado. “Não estamos num debate acadêmico: no Brasil de hoje, é melhor não fazer nada, não mexer na meta nem no ano calendário”, disse.

O Brasil, lembra ele, é um país onde a memória inflacionária é muito alta e a história mostra que o desvio da inflação em relação à meta costuma ser para mais, não para menos.

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Sobre as críticas que Roberto Campos Neto tem recebido por parte do governo, Arida afirma que elas só criam mais turbulência nos mercados e não ajudam a derrubar a inflação. “Tecnicamente, pode se fazer a discussão se deve subir ou baixar, se o Banco Central errou. É discussão técnica, não política”, ponderou.

A respeito do retorno dos subsídios pelo BNDES, ele classificou como errada a noção de expandir financiamento com subsídios. “Tenho sempre um receio de você começar fazendo um pouco de subsídios numa área e expande para outras”, alerta.

Ele disse defender a o apoio à inovação, usado como justificativa pelo governo no anúncio de ontem, mas sugere como alternativa baixar tarifas para poder importar máquinas e equipamentos mais produtivos.

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Arida disse ao jornal que o novo arcabouço fiscal tem como positiva a sinalização de uma preocupação do PT com a estabilidade da dívida pública a médio prazo, mas fez a ressalva que existe um incentivo para aumentar a receita para gastar mais.

“O Brasil já tem uma carga fiscal muito elevada. Eu preferiria uma regra mais simples e abrangente: a soma de todos os gastos primários, incluindo transferências constitucionais, teria que permanecer constantes em termos reais por alguns anos”, disse.

Para ele, a estabilidade dos gastos em termos reais seria a melhor solução porque colocaria sobre o governo a preocupação de diminuir despesas obrigatórias e reavaliar as políticas de gasto.