XP revisa inflação para cima, mas acredita que juros vão cair mais cedo com desaceleração de crédito

Para o Ibovespa, casa estima valor justo de 128 mil pontos este ano

Mitchel Diniz

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Diante de uma inflação ainda elevada e pressionada por uma política fiscal considerada expansionista, mesmo após o novo arcabouço fiscal, a XP revisou suas projeções para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2023 e 2024. Para este ano, a projeção saltou de 5,5% para 6,2%. Quanto ao próximo ano, a XP vê a inflação em 5% (ante 4,5%, na projeção anterior).

Esta foi uma das principais mudanças de projeção de casa anunciadas nesta quinta-feira (6), no relatório “100 dias de 2023”. Os principais experts da XP relembraram as perspectivas que trouxeram no final do ano passado e atualizaram algumas delas, à luz dos principais fatos ocorridos em 2023 até agora.

A XP acredita que o afrouxamento monetário deve acontecer antes do previsto anteriormente, consequência de uma desaceleração no mercado de crédito. A casa projeta o início dos cortes na taxa de juros a partir do segundo semestre de 2023, com uma redução de 0,25 ponto percentual em agosto, seguido de reduções de 0,5 ponto.

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Na visão da XP, a Selic deve encerrar este ano em 12% e ser reduzida a 11% no primeiro trimestre de 2024, mantendo-se assim até o final do ano que vem.

A casa também manteve a projeção de crescimento de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2023, após alta de 2,9% em 2022. “A atividade doméstica continua em trajetória positiva, porém com sinais cada vez mais claros de desaceleração”, diz o relatório.

A estimativa da taxa de câmbio permaneceu em R$ 5,30 para o final deste ano. “A nosso ver, a incerteza fiscal e os ruídos políticos sobre o quadro fiscal pesam sobre a taxa de câmbio, evitando a valorização que seria esperada pela balança comercial positiva e pelos preços de commodities favoráveis.”

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O valor justo para o Ibovespa, ao fim de 2023, foi revisado de 125 mil para 128 pontos, com melhoras nas projeções de lucros das empresas e taxas reais de longo prazo mais baixas.

“Porém, as incertezas em relação ao ciclo de aperto do Federal Reserve e o aumento dos temores de uma recessão — e agora acrescentando a incerteza se a crise bancária pode levar a um risco sistêmico — podem manter o apetite global por risco reduzido por mais tempo”, escreveram os estrategistas Fernando Ferreira, Jennie Li e a analista Rebecca Nossig.

Eles observam que o mercado continuou pressionado pelas incertezas políticas no primeiro trimestre de 2023 – e como resultado dessas pressões domésticas, o Brasil teve um desempenho inferior aos mercados globais no período, caindo -7,2% em reais.

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A XP trabalha com diferentes estimativas de valor justo para o Ibovespa, incorporando cenários alternativos, que variam de 88 mil pontos em um cenário pessimista a 149 mil, no otimista.

“A conclusão é que o Ibovespa atualmente precifica um cenário mais próximo do pessimista do que do otimista. Isso corrobora nossa visão de que a margem de segurança das ações brasileiras hoje é bastante elevada”, escreveram os analistas.

Para a equipe da XP, ainda que o mercado brasileiro tenha tido desempenho inferior aos seus pares emergentes nos 100 dias de 2023, os ativos seguem atrativos com oportunidades em várias classes.

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Os analistas observam que a inflação tem se mostrado mais persistente do que o esperado, o que deve levar os bancos centrais da América Latina a manterem os juros em patamares elevados por mais tempo.

“Embora não projetemos um quadro recessivo na maioria dos países da região, a desaceleração da atividade econômica começa a ficar mais clara.”

De acordo com a XP, os ativos financeiros da região permanecem descontados, refletindo riscos políticos domésticos e aversão ao risco global.

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“Vemos potencial de valorização das moedas latino-americanas, porém os preços dos ativos continuarão reféns dos desenvolvimentos domésticos e globais”, diz o relatório.

XP segue defensiva em sua carteira

No relatório sobre os 100 dias de 2023, a XP reiterou sua posição defensiva e preferência por ativos mais resilientes e de alta qualidade. A casa continua apostando em três temas principais. O primeiro, empresas ligadas a commodities, pela exposição que elas têm ao dólar.

“Atualmente, gostamos de nomes como Suzano (SUZB3) para proteção contra a volatilidade da moeda brasileira, devido a riscos fiscais e políticos domésticos”, diz o relatório.

A casa também mantém preferência por histórias de crescimento secular, ou seja, teses de investimentos que tenham baixa correlação com o crescimento econômico. Nomes como Hypera Pharma (HYPE3) e Assaí (ASAI3) permanecem nas carteiras recomendadas da XP.

“Seguimos distantes de nomes com valuations esticados no momento, preferindo empresas de alta qualidade que são geradoras de caixa, que não estão muito alavancadas ou sejam histórias de turnaround.”

Jennie Li, estrategista de ações da XP, explica que o investidor estrangeiro busca empresas de commodities por ser um ativo real e para se proteger da inflação.

A preferência da XP por esse setor está ligada a uma expectativa de recuperação de preços em decorrência da abertura econômica da China e alguns fatores domésticos, ainda que os riscos de uma recessão estejam no radar. Petrobras (PETR3);(PETR4) segue fora das carteiras da casa por conta de riscos políticos.

Sobre a inclusão nas carteiras de empresas que podem se beneficiar com a queda dos juros, Jennie diz que é uma discussão que está no começo.

“Ainda há muitos riscos lá fora, de Federal Reserve, de recessão, uma discussão sobre crise bancária que não sabemos como vai se desenrolar”, afirma.

“Há muito o que entender antes de se posicionar em temas mais sensíveis a variação de juros”.

Brasil continuou sendo destaque entre emergentes

A XP reconhece que o Brasil foi um dos principais destinos de investimentos financeiros entre os países emergentes desde o início do ano.E a casa acredita que o cenário global segue favorável ao Brasil, pelo menos em termos relativos a outros emergentes. As boas perspectivas, porém, não virão sem esforços na direção de uma política econômica saudável.

“Apontávamos que a continuidade da desinflação dependia da estabilidade fiscal, o que
classificávamos como o principal risco doméstico para a economia brasileira. Avançamos pouco nesta frente”, avaliam Andre Pardos e Francisco Nobre,citando o tão aguardado arcabouço fiscal que substituirá o teto de gastos.

“Boa notícia: há um limite para a expansão fiscal à frente. Notícia não tão boa: esse limite é
amplo o suficiente para que a política fiscal continue expansionista, a menos que venha um
aumento significativo (e incerto) da carga tributária”, observam. Isso não necessariamente abre espaço para uma taxa de juros mais baixa ao longo do tempo, uma vez que a postura fiscal permanecerá expansionista.

Na reforma tributária, os analistas consideram que a evolução foi positiva. “O governo nomeou o experiente Bernand Appy como secretário especial, profundo conhecedor da matéria. E o presidente da Câmara, Artur Lira, sinalizou positivamente com sua aprovação no Congresso. Como trata-se de uma das principais fontes de custo Brasil, esse é um potencial fator positivo para o cenário este ano.”

EUA: juros em 5,5% e recessão moderada

A XP observa que as pressões inflacionárias nos Estados Unidos se mantiveram persistentes ao longo deste ano e o mercado de trabalho segue apertado. Mas o período também foi marcado por preocupações com uma crise financeira, após o colapso do Silicon Valley Bank e outros bancos regionais.

A expectativa anterior era que o Fed subisse os juros para patamares mais altos por mais tempo. Porém, diante desse cenário nebuloso, a XP acredita que o FOMC deve adotar uma abordagem mais cautelosa para a política monetária e encerrar o ciclo de aperto monetário em breve, com taxa terminal de 5,25% ou, “no máximo”, 5,5%.

“Vemos espaço para flexibilização da política monetária a partir do início do ano que vem, conforme o processo de desinflação avance, e vemos a taxa básica de juros chegando
em 3,5% no final de 2024”, diz o relatório da XP.

A casa também avalia que a atividade econômica dos Estados Unidos se mostrou mais resiliente do que o esperado. Os analistas observam que as condições pioraram apenas recentemente, como efeito defasado do aperto monetário, entrando em território contracionista. Esse impacto deve se tornar cada vez mais evidente.

A recente crise bancária, por sua vez, deve resultar em crédito mais restrito para famílias e empresas, trazendo impactos para a atividade econômica e o mercado de trabalho. Diante disso, a XP ainda acredita que os EUA deve enfrentar uma “recessão moderada” no final deste ano ou início do ano que vem.

Guerra na Ucrânia e China

A previsão também de efeitos contracionista para as economias europeias, submetidas ao aperto monetário. A XP acredita que os países do velho continente poderia entrar em cenário recessivo mais profundo, ainda que a atividade econômica venha mostrado forte resiliência e uma melhora significativa na crise energética.

Contudo, a casa avalia que o cenário geopolítico ainda inspira preocupações. Ainda que o impacto da guerra na Ucrânia sobre as commodities tenha diminuído, e as perspectivas para o conflito tenham se tornado menos pessimista, o embate continua, sem sinais de resolução

“Ao todo, as perspectivas para a região se tornaram menos pessimistas, mas a atividade econômica deve desacelerar consideravelmente ao longo do ano em meio a condições financeiras mais apertadas”, diz o relatório da XP.

Com relação à China, a reabertura da economia com o relaxamento das restrições da política de Covid Zero trouxe perspectivas de crescimento sólido para 2023. A XP observa que os baixos níveis de inflação no país permitiram política monetárias e fiscais expansionistas e a casa prevê um crescimento de 5,6% para a economia chinesa este ano (acima da meta de 5%, anunciada pelo governo).

Mitchel Diniz

Repórter de Mercados