PSOL apresenta projeto para tirar autonomia do Banco Central e facilitar exoneração do presidente da autarquia

Texto, de autoria da bancada da sigla na Câmara, também prevê a criação do “Observatório de política monetária”

Luís Filipe Pereira Marcos Mortari

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Em meio aos ataques recentes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à política monetária, conduzida pelo Banco Central, e ao presidente da instituição, Roberto Campos Neto, a bancada do PSOL na Câmara dos Deputados apresentou, na terça-feira (7), um projeto de lei com o objetivo de revogar a autonomia da autoridade monetária.

O texto, a que o InfoMoney teve acesso, propõe alteração na própria lei complementar (Lei Complementar nº 179, de 2021) que caracterizou o Banco Central como autarquia de natureza especial e estabeleceu regras para nomeação e exoneração de seu comandante e diretores, com mandatos não coincidentes.

A legislação atual, aprovada pelo Congresso Nacional em fevereiro de 2021, prevê que o mandato do presidente do BC tenha duração de quatro anos, com início em 1º de janeiro do terceiro ano do mandato do Presidente da República.

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Ou seja, pela regra, Roberto Campos Neto deve permanecer no comando da autoridade monetária até dezembro de 2024, quando poderá ser substituído por um nome a ser indicado por Lula, que depende do aval do Senado Federal.

A lei também estabelece uma escala para os mandatos dos diretores do Banco Central, de modo a conferir estabilidade na tomada de decisões e reduzir os riscos de mudanças abruptas e maior suscetibilidade a interferências políticas.

Todos esses dispositivos são retirados do projeto de lei complementar apresentado pela bancada do PSOL. Neste aspecto, fica mantida a prerrogativa da Presidência da República de indicar o responsável por comandar o BC, mediante aprovação dos senadores. Os parlamentares argumentam que este seria o modelo mais adequado para a condução da política econômica.

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“No aspecto econômico, a nossa proposta restabelece a coordenação das políticas monetária e fiscal e, portanto, a harmonia da política econômica. Atrelar política fiscal e de juros, taxa inflacionária e política cambial ao contexto nacional e das políticas do governo é fundamental”, destacou o texto.

O texto, divulgado pela liderança da sigla, classifica o atual modelo de gestão do BC como “autoritário”, e o aponta como responsável pelo aprofundamento das desigualdades sociais no país. Eles dizem que o Banco Central não pode ter “objetivos distintos das políticas do governo federal”.

“Ao perseguir a meta da inflação sem qualquer preocupação com outra política econômica, a autoridade monetária pode prejudicar políticas do governo, agindo inclusive pró-ciclicamente e causando o colapso de medidas governamentais, mesmo as essenciais”, argumentam os parlamentares.

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Outra modificação sugerida pelo projeto de lei facilitaria a exoneração do presidente e dos diretores do Banco Central. Atualmente, há quatro situações em que eles podem deixar o cargo: 1) a pedido; 2) no caso de acometimento de enfermidade que incapacite o titular para o exercício do cargo; 3) quando sofrerem condenação, mediante decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, pela prática de ato de improbidade administrativa ou de crime cuja pena acarrete, ainda que temporariamente, a proibição de acesso a cargos públicos; 4) quando apresentarem comprovado e recorrente desempenho insuficiente para o alcance dos objetivos do Banco Central.

Na última hipótese, o Conselho Monetário Nacional (CMN) – órgão composto pelos ministros da Fazenda (hoje Fernando Haddad) e do Planejamento e Orçamento (Simone Tebet) e pelo presidente do BC (Roberto Campos Neto) – precisa submeter à Presidência da República a proposta de exoneração, que também dependerá do aval do Senado Federal, por decisão da maioria absoluta do plenário.

O projeto de lei complementar reduz as exigências para este caso, com a simples necessidade de exposição de motivos pelo presidente da República. Já a quarentena para diretores e presidente da instituição seria elevada de 6 para 48 meses.

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O texto também dá destaque ao fomento ao pleno emprego como objetivo fundamental do Banco Central – inclusive aparecendo antes do próprio controle da inflação. “O Banco Central do Brasil tem por objetivo fundamental assegurar a estabilidade de preços”, diz o primeiro artigo da proposta.

Na lei que conferiu autonomia à autoridade monetária, o combate à inflação aparece como único objetivo fundamental. Em parágrafo único, na sequência, são elencados como objetivos do BC “zelar pela estabilidade e pela eficiência do sistema financeiro, suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego”.

O projeto também retira uma série de dispositivos que conferiam autonomia ao BC. A lei em vigor diz que “o Banco Central é autarquia de natureza especial caracterizada pela ausência de vinculação a ministério, de tutela ou de subordinação hierárquica, pela autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira, pela investidura a termo de seus dirigentes e pela estabilidade durante seus mandatos”. Já o texto sugerido pelos parlamentares coloca a instituição em “subordinação hierárquica ao Presidente da República”.

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Abrindo a possibilidade para a participação de setores da sociedade, o projeto de lei complementar prevê, ainda, a criação de um “Observatório de Política Monetária”.

Os autores argumentam que o órgão teria como objetivo “atuar em ampla colaboração com movimentos sociais, universidades, sindicatos e especialistas com experiência e autoridade na matéria, bem como com o Congresso Nacional, as Assembleias Legislativas estaduais e as Câmaras municipais, além de outros países e organismos internacionais”.

O projeto de lei complementar é assinado pelo líder do PSOL na Câmara dos Deputados, Guilherme Boulos (SP) e também pelos deputados Célia Xakriabá (MG), Sâmia Bomfim (SP), Chico Alencar (SP), Erika Hilton (SP), Fernanda Melchionna (RS), Glauber Braga (RJ), Ivan Valente (SP), Luiza Erundina (SP), Henrique Vieira (RJ), Luciene Cavalcante (SP) e Talíria Petrone (RJ).

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A bancada do PSOL conta com 13 deputados federais na nova legislatura – o que corresponde a 2,53% de todos os assentos da Câmara dos Deputados. A aprovação de um projeto de lei complementar depende de maioria absoluta em plenário nas duas casas legislativas – ou seja, metade dos membros mais um (na Câmara, 257, e no Senado, 41).

Ontem (7), Boulos afirmou que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, é um “infiltrado” do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que faz “boicote” à economia com a manutenção da taxa básica de juros do País, a Selic, em 13,75% ao ano.

Além do projeto de lei, a bancada do partido, que apoia o presidente Lula, deve apresentar um requerimento de convite para Campos Neto explicar na Câmara a política de juros adotada pelo BC.

“Campos Neto é um infiltrado no governo Lula, um infiltrado do ex-ministro da Economia Paulo Guedes, um infiltrado do Bolsonaro. É um cara que não deixa a taxa de juros baixar. Tem um interesse, na minha opinião, de boicote à economia, à geração de empregos, à retomada do crescimento econômico”, disse Boulos, no Salão Verde da Câmara.

“Não dá para você ter o povo escolhendo na urna um caminho e a política monetária ouvindo o mercado, não refletindo esse mesmo caminho. Isso é uma contradição e um problema desse modelo de autonomia do Banco Central”, continuou.

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