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Com o início dos ataques russos à Ucrânia, os olhares do mundo se voltaram para a região, mas sem esquecer de um outro canto do planeta.
Uma área de 3,5 milhões de km², ou 1,6% do tamanho da Terra, responsável por US$ 1 em cada US$ 5 do comércio global, além de 60% de todo comércio marítimo no mundo: o Mar do Sul da China.
É nessa região que o segundo país mais rico da Ásia (e não, não estamos falando do Japão) enfrenta um inimigo poderoso e que sequer reconhece a sua existência.
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A República da China, também conhecida como Taiwan, tem sido tratada por Pequim como uma região rebelde, cuja existência enquanto nação independente é negada.
Taiwan segue pouco abaixo de Singapura (US$ 59,7 mil), mas ainda assim é mais rica do que Japão, Suécia, Alemanha, França e diversas outras potências, com um PIB per capita de US$ 55,7 mil.
Pequim acredita que o país vizinho, que se declarou independente após opositores do regime chinês fugirem para a região, indiscutivelmente faz parte do território chinês. Quem também reconhece essa versão da história é, justamente, a Rússia.
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Ao contrário da Ucrânia, Taiwan é um país rico, cuja importância na economia global é maior do que a de diversos países com populações maiores que seus 23 milhões de habitantes.
Taiwan é ainda uma democracia consolidada, com liberdade de imprensa, religiosa, sexual e de qualquer outra expressão que acompanhe o pacote de uma democracia liberal plena, o que, por sua vez, é mais um motivo para irritar Pequim.
A riqueza de Taiwan, porém, não veio dos céus ou da ajuda estrangeira. Ao contrário, o país se consolidou com uma indústria de ponta, anos (se não décadas) à frente de Europa e Estados Unidos, além da própria China, quando o assunto é semicondutores.
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Um problema na cadeia de suprimentos de Taiwan em 2020, por exemplo, levou a inflação americana ao maior nível desde os anos 1980, com uma alta expressiva no preço de carros usados (e isso também aumentou seu IPVA por aqui). Afinal, carros novos demandam chips. Se, por qualquer razão, Taiwan tem problemas em fornecê-los, a economia mundial declina.
O prejuízo foi de US$ 210 bilhões apenas na indústria automotiva. É como se o estado do Rio de Janeiro tivesse sumido da economia global.
Apesar de ser a mais relevante, essa não é a única questão geográfica envolvendo Rússia e China, dois países que, a despeito das boas relações atuais, não possuem um histórico de muita coesão, em partes por disputas entre si, como o conflito sino-soviético de 1962, com uma guerra não declarada de sete meses.
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A presença chinesa na Sibéria também levanta preocupações de Moscou, além, claro, da expansão de parcerias econômicas da China com os países da Ásia Central como Cazaquistão, Turcomenistão, Quirguistão e Tadjiquistão.
A China tem expandido sua “Nova Rota da Seda” para a região, o que ameaça a influência russa, considerando que se trata de um território composto por ex-repúblicas soviéticas.
Mas há também uma boa união entre os países em torno da geografia. O projeto da Rota da Seda chinês, prevê uma série de investimentos para explorar o Oceano Ártico, construindo portos na Rússia que, por sua vez, devem criar uma rota de comércio global, encurtando a rota Shanghai-Roterdã pela metade.
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São investimentos que podem chegar a US$ 300 bilhões e facilitariam o escoamento tanto de produtos chineses quanto da energia (petróleo e gás) russa. O Ártico, em si, é uma questão geográfica central para a Rússia.
A questão energética também é outro ponto crucial entre os dois países. Note que a Rússia é, por larga vantagem, essencialmente um país exportador de energia, enquanto a China segue dependente de importações.
Ainda assim, os chineses não parecem dispostos a entregar aos russos a missão de suprir o país. Os investimentos na Ásia Central e na África mostram que a relação da China com a energia é justamente a de evitar dependência em relação a outra potência nuclear. A propósito: a Rússia também estuda entrar na disputa pelo continente africano.
Um ponto tão (ou até mais) relevante nesse conflito quanto a geografia é a questão demográfica.
Nesse sentido, Rússia e China estão “abraçados” diante do mesmo problema.
Se em 1991, quando a União Soviética ruiu, a população russa era de 148,5 milhões de pessoas, neste momento ela está em 144,1 milhões.
Como o Brasil deixa evidente, o crescimento populacional é parte inerente do crescimento econômico. Por aqui, nas últimas três décadas, ao menos três quartos do nosso crescimento veio de puro aumento populacional.
Ambas as nações, China e Rússia, devem envelhecer antes de ficarem ricas.
Neste momento, considerando o PIB por paridade de poder de compra, a Rússia ostenta um PIB per capita de US$ 26,8 mil, contra US$ 17,7 mil da China.
No caso chinês, o envelhecimento da população ameaça criar instabilidade no país.
Para se ter uma ideia, os chineses possuem juntos um patrimônio de US$ 74,5 trilhões. Desse valor, ao menos 75% são imóveis, número que fica abaixo de 50% nos EUA ou na Europa.
Historicamente, os chineses, como os asiáticos em geral, são exímios poupadores. Em boa medida porque não há sistema de seguridade social na China.
Em resumo, os jovens na China poupam para ter renda na velhice ou sustentar seus pais. Com a queda na população, o efeito mais rápido na economia é a diminuição na demanda por imóveis.
Atualmente, um imóvel em Xangai gera, em média, 2% de renda anual.
Fundos de previdência costumam trabalhar com algo entre 6% e 8% ao ano de retorno para se manterem viáveis.
Na próxima década, Pequim terá de lidar com uma queda de renda da população no país e um aumento de custos para sustentar uma população cada vez mais idosa.
Como o regime fará para manter a coesão social ou, na prática, manter a si mesmo de pé, é a questão que deve definir a próxima década. E tudo, claro, passa pela geografia.