SÃO PAULO – Nesta quarta-feira (16), o Comitê de Política Monetária (Copom) anunciou mais uma elevação da Selic, a taxa básica de juros da economia, de 3,5% ao ano (a.a.) para 4,25% a.a., a terceira alta consecutiva. A subida de juros pede atenção do consumidor que pretende comprar um imóvel financiado nos próximos meses.
Na prática, a variação da Selic está diretamente relacionada aos custos dos empréstimos imobiliários porque as instituições financeiras, responsáveis por ofertar esse tipo de financiamento, costumam repassar essa flutuação da taxa básica de juros às taxas cobradas nos contratos.
Dessa forma, quando a Selic cai, como vimos nos últimos anos, as prestações tendem a se tornar mais suaves, viabilizando a compra de um imóvel para mais pessoas. Por outro lado, o oposto é verdadeiro: quando a Selic as parcelas tendem a ficar mais caras.
Com um ciclo de queda que durou anos, o que se viu em 2020, com a Selic em seu menor patamar histórico (2,0% a.a.), foi um recorde no volume financeiro negociado: cerca de R$ 93,9 bilhões, maior valor para os últimos dez anos, segundo os dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip).
E o mercado continua aquecido em 2021. O volume de financiamentos imobiliários deu um novo salto de 107% no primeiro quadrimestre de 2021, na comparação com o mesmo período de 2020. As operações de aquisição de imóveis entre janeiro e abril chegaram ao valor de R$ 49,6 bilhões, com 176,3 mil unidades vendidas, segundo os dados mais recentes da Abecip.
Em março, os especialistas em financiamento avaliavam as taxas como atrativas e consideravam que o momento era de compra de um imóvel. Porém, a decisão do Copom é a terceira seguida na direção de aumento da Selic, e a sinalização é de mais aumentos pela frente.
Diante desse novo cenário e dos diferentes tipos financiamento disponíveis, o que muda? Qual é a melhor opção para realizar o sonho da casa própria no cenário atual? E o que considerar na decisão? Confira.
Compare os financiamentos
O InfoMoney consultou especialistas em crédito e mercado imobiliário para mostrar como escolher a melhor alternativa entre o financiamento com taxas prefixadas mais a Taxa Referencial (TR), o mais tradicional, e as opções lançadas mais recentemente, que cobram uma taxa prefixada mais o IPCA ou taxa prefixada mais a remuneração da poupança.
As simulações abaixo foram feitas pela CrediHome, fintech especializada em comparação de crédito, e consideram, em todos os casos, dois imóveis com preços diferentes (de R$ 500 mil e R$ 800) e financiamento de 80% do valor deles, um contrato de 30 anos e as taxas de juros mínimas disponibilizadas pelos bancos — em alguns casos, o cliente pode conseguir taxas melhores ou piores a depender da relação que tiver com o banco.
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Além disso, foram considerados dois cenários: o cenário 1 leva em consideração o momento atual de juros no país, ou seja, a Selic em 4,25% a.a., conforme o resultado do Copom desta quarta (16), e o IPCA no patamar de 5,82% a.a., segundo a projeção do Boletim Focus, divulgado na segunda (14) pelo Banco Central.
No caso do IPCA, a simulação não considerou o acumulado dos últimos 12 meses, que seria o patamar mais atual, porque o índice acumula alta de 8,06% no período, mas usar esse dado na simulação iria distorcer muito a parcela final e o valor total do financiamento.
“Em um contrato tão longo, como no caso do financiamento imobiliário que pode durar 30 anos, não tem como prever como o IPCA vai se comportar, o índice costuma ser muito volátil. Pode ser que suba, mas também pode ser que diminua, como a projeção para 2022 do Focus, que prevê o IPCA em 3,70% a.a.”, explica Dario Ferraço, sócio da SF Consultoria.
O cenário 2, por outro lado, tenta mostrar uma situação futura, ou seja, como as parcelas e custos do financiamento ficariam, se o cenário de juros fosse diferente. Assim, foi considerada a Selic em 6,5% a.a., e o IPCA em 3,70% a.a., conforme as projeções do Boletim Focus da última segunda (14) para 2022.
As cotações foram feitas com base no Sistema de Amortização Constante (SAC), tipo de financiamento no qual as parcelas vão diminuindo com o passar do tempo.
As simulações também consideram que os indexadores ficariam estáveis ao longo de todo o contrato, o que é improvável que aconteça, mas importante entender que as tabelas são um exercício para ajudar o leitor a refletir sobre o melhor custo-benefício para ele, considerando diferentes modalidades de financiamento e os juros.
Confira o resultado:
Qual modalidade escolher?
Considerando as premissas da simulação, o financiamento imobiliário atrelado à TR do Santander seria o mais vantajoso em todos os cenários, considerando que essa modalidade é minimamente impactada pelo efeito de alta da Selic e do IPCA. Ainda assim, vale lembrar que hoje a TR está zerada, mas pode subir em um cenário de elevação mais agressiva de juros (entenda a TR e como ela é calculada).
Dario Ferraço, sócio da SF consultoria e especialista em mercado imobiliário, explica que a modalidade da TR é que oferece mais estabilidade em termos de custos mensais, e ressalta a importância do perfil do consumidor na hora de escolher a modalidade do financiamento.
“É a modalidade mais tradicional, afinal até dois anos atrás não tinham outras opções variáveis. O cliente não encontra surpresas, sendo mais indicada quando o cliente não tem projeção de antecipar a quitação do financiamento, ou seja, pretende pagar as parcelas no prazo previsto no contrato”, diz.
Como a simulação mostra, com o passar do tempo, as modalidades de poupança e IPCA são mais imprevisíveis por estarem atreladas a indexadores mais voláteis.
Na linha da poupança, por exemplo, o tomador paga os juros fixos, como os 3,95% no caso do Itaú e Bradesco, por exemplo, mais a remuneração da poupança, que é limitada a 6,17% a.a. mais a TR.
O teto existe porque a poupança rende 70% da Selic mais a TR quando a Selic é menor ou igual a 8,5% a.a. Se a taxa básica passa de 8,5% a.a., ela retorna à regra antiga e passa a render 6,17% a.a. mais a TR (ou 0,5% ao mês mais a TR), que é sua remuneração máxima.
Assim, os juros dessa modalidade não ultrapassam os 10,15% a.a. (3,95% + 6,17%) na modalidade. No caso da Caixa, essa parte fixa por ser encontrada por a partir de 3,35% a.a. por clientes que já tenham boa relação com o banco, o que deixaria o patamar desse teto em 9,52% a.a. (saiba mais aqui).
“O modelo corrigido pela poupança é mais adequado para um perfil moderado. É para o cliente que deseja garantir uma taxa bem competitiva no cenário 1 da simulação, porém, com um indexador que pode sofrer variação futura, por meio da Selic”, avalia Ferraço.
Daniele Akamine, advoga do escritório Akamine Advogados e Negócios Imobiliários, concorda que o modelo corrigido pela poupança exige uma tomada de risco maior, mas pondera na comparação com o IPCA. “Em uma escala de risco, a poupança fica no meio termo entre TR e IPCA, justamente por ter o limite na variação. Os 10,15% ao ano, é uma taxa alta, mas ainda é menos arriscada que a modalidade do IPCA, bem como é mais previsível”, avalia a advogada.
Já a modalidade corrigida pelo IPCA seria indicada para um tomador mais agressivo, já que as correções que o indexador pode sofrer não têm limites. “É recomendada para clientes que têm a possibilidade de quitar caso o IPCA dispare ao longo do contrato, ou que vão fazer contratos mais curtos, de cerca de 10 anos”, diz Ferraço.
Daniele acredita que mesmo quem vai fazer um financiamento mais curto, deve avaliar com muita calma a opção do IPCA.
“O IPCA pode parecer mais atrativo, pelo valor menor de prestação inicial, na comparação com a opção corrigida pela TR, por exemplo. Porém, é uma situação de curto prazo. E nos primeiros meses de financiamentos o saldo devedor é o maior do contrato, ou seja, as parcelas são mais caras. Se considerarmos que o IPCA continuará subindo nos próximos meses, o que é bem provável, pode ficar inviável para alguns consumidores arcarem com essa variação ao longo do tempo”, explica a advogada.
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Além de ser mais arriscada, a opção atrelada ao IPCA tem um custo muito maior que as outras modalidades hoje e, mesmo no cenário projetado, no qual o Focus indica uma queda do IPCA dos atuais 8,06% para 5,82% a.a. ao fim de 2021, a linha ainda segue sendo mais cara em ambos os cenários e imóveis.
“As opções atreladas à poupança e IPCA ainda são muito incertas, principalmente porque qualquer projeção econômica no Brasil para mais de dois ou três anos é quase impossível – com eleições ano que vem, pode ser ainda mais difícil projetar algo. Então, tem que estar preparado para variações expressivas e nem todo mundo tem esse perfil”, complementa o sócio da SF Consultoria.
É verdade que da mesma forma que a Selic e o IPCA estão em alta, eles podem cair o que também impactaria na parcela. Porém, a sinalização do Copom foi de mais altas pela frente, e o IPCA, embora seja difícil dizer o patamar dos próximos meses, mas o que se vem observando são altas mensais consecutivas em 2021. Em maio, o IPCA teve alta de 0,83% ante abril, acima do esperado e a maior alta para o mês em 25 anos. Em 2021, o índice acumula alta de 3,22% e, em 12 meses, de 8,06%.
De olho no CET
Embora a taxa de juros seja o dado mais mencionado e discutido na hora de fechar um financiamento, não é o único custo dessa operação. Independentemente da modalidade que o cliente escolher, Alberto Azjental, coordenador do curso de Desenvolvimento de Negócios Imobiliários da Fundação Getúlio Vargas (FGV), lembra que é importante observar o Custo Efetivo Total (CET) da operação, a taxa que mostra efetivamente o que vai sair do bolso do consumidor.
“O CET inclui todas as despesas do financiamento que vão além dos juros do empréstimo, como os custos da contratação em si; tarifas operacionais; e os seguros obrigatórios, cujos preços variam de banco para banco. Geralmente, essa taxa é informada pelo banco na hora da contratação. É interessante compará-la em diferentes instituições”, diz o coordenador da FGV.
Portanto, olhar o CET pode ser também uma boa forma de decidir qual será a melhor modalidade de crédito e o melhor banco.
Portabilidade de crédito
Vale lembrar que a portabilidade de crédito pode ser uma alternativa para quem fechou contratos corrigidos pelo IPCA ou pela Poupança, por exemplo, e quer fugir dessas possíveis variações das taxas nos próximos anos.
O InfoMoney fez uma reportagem explicando tudo o que é necessário sobre portabilidade e, em nota, Banco do Brasil, Caixa Econômica e Santander informaram que podem receber portabilidade de diferentes modalidades. Ou seja, seria possível sair do IPCA e ir para a TR, por exemplo.
A recomendação para o cliente, no entanto, é contatar a instituição com a qual o fechou o contrato, bem como outros bancos para avaliar as possibilidades. “Nem sempre migrar entre modalidades diferentes é possível. O que é mais comum é renegociar as taxas”, pontua Daniele.
É hora de comprar um imóvel?
Apesar da elevação da taxa básica de juros, os especialistas defendem que o momento ainda é propício para a compra do imóvel.
“Do ponto de vista de oportunidade para quem quer comprar um imóvel, esse aumento na Selic é um sinal de alerta, mas não uma bandeira vermelha. É preciso ficar mais atento porque um ciclo de alta de juros começou. Mas ainda é um bom momento. Comparando com os últimos 5 anos, a Selic em 4,25% a.a. ainda é baixa”, avalia Daniele.
Bruno Gama, CEO da Credihome, também entende que ainda está atrativo comprar um imóvel e afirma que a procura por crédito imobiliário deve continuar forte e sustentada nesses próximos meses. Isso porque na Credihome, por exemplo, 2021 segue aquecido: até o final de maio, foi registrado um volume de R$ 859,5 milhões em crédito imobiliário. “O montante já corresponde a 72% do volume apurado no ano passado, que chegou R$ 1,2 bilhão”, explica Gama.
Eduardo Zylberstajn, economista da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), também afirma que essa sequência de aumentos na Selic ainda não é muito expressiva. “Não acho que teremos impactos imediatos nos juros dos financiamentos por conta deste aumento, mas hoje estamos vivendo um boom imobiliário, com o mercado muito aquecido principalmente pelo patamar de juros que alcançamos no ano passado, muito baixo para o padrão histórico. Então, pode ser um bom momento para compra considerando que os juros estão baixos, e os financiamentos ainda acessíveis”, diz.
Porém, ele também ressalta que o setor já apresenta sinais de mudança. “O ambiente está em ritmo de mudança, ainda não sabemos o tamanho dela ou até quando vai o aumento de juros, a inflação alta e esse novo período. Mas fato é de que as perspectivas estão mudando. Portanto, é um momento de reflexão, um novo ciclo de alta de juros deve impulsionar um aumento no custo de financiamento e aumento de preços nos imóveis também no médio prazo”, afirma.
Em linha, Fabio Tadeu, economista e sócio da Brain Inteligência Estratégica, explica que os preços dos imóveis já vêm subindo pela alta na demanda desde o ano passado, mas que ainda devem subir mais neste ano.
“Tem dois fatores principais: os custos de construção subiram muito. O INCC [Índice Nacional da Construção Civil] subiu muito, acumulando 15,26% nos últimos 12 meses [dados da FGV] puxando todo o custo dos insumos da construção para cima, o que deve impactar nos preços dos lançamentos de imóveis nos próximos meses. Além disso, estamos em um patamar de baixo de estoque, com uma procura alta e quando isso acontece os preços tendem a subir. Devemos ver esse movimento já no segundo semestre deste ano”, avalia.
Por isso, Daniele acredita que o consumidor que acredita que está em um momento de vida adequado para a compra de um imóvel não deve esperar muito mais. “A Selic regula a taxa de juros do mercado, naturalmente, não é a única coisa que regula a taxa do financiamento, mas é um termômetro. Como o produto crédito imobiliário é muito importante para os bancos, desde que a Selic voltou a subir não tivemos anúncios oficiais de repasses”, diz.
“Esse produto fideliza o cliente, é de longo prazo, nenhuma instituição quer perder o cliente potencial de financiamento imobiliário. Ao mesmo tempo, ninguém quer deixar dinheiro na mesa. Nesse sentido, a partir de agora as chances de o repasse das altas por parte dos bancos começar são mais altas”, completa.
O InfoMoney contatou os cinco principais bancos do país para entender sobre esse repasse.
Caixa, Santander, Bradesco, Itaú e Banco do Brasil deram respostas que foram na mesma linha: sem mudanças nas taxas até agora. Porém, nenhum dos bancos se posicionou sobre o possível aumento para os próximos meses com a Selic a 4,25% a.a.
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