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SÃO PAULO – A pandemia causada pelo novo coronavírus cancelou os gastos de muitos brasileiros com bares, restaurantes e viagens. Por outro lado, outra categoria de entretenimento cresceu: a de vinhos.
Segundo a Wine Intelligence, empresa de pesquisas no setor, o consumo da bebida cresceu no país mesmo em um ano de incertezas econômicas.
Cerca de 3 milhões de consumidores regulares de vinho (que bebem ao menos uma vez por mês) foram adicionados de 2019 para 2020. Foi um aumento de 8,3%, resultando em 39 milhões de consumidores brasileiros. Em 2010, o país tinha 22,4 milhões de pessoas com esse perfil.
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Esses regulares também beberam mais em 2020. Em litros vendidos, a alta foi de 28% sobre 2019 e atingiu o recorde histórico de 200 milhões de litros.
Negócios dos mais diversos portes que atuam no setor de vinhos acompanharam o aumento no consumo, refletido nas vendas. Depois de um ano com saldo positivo, as empresas projetam resultados ainda melhores em 2021.
Há espaço para mais crescimento. O Brasil ocupa o 74º lugar no mundo no ranking de consumo de vinho per capita, segundo a Wine Intelligence. Somando os 39 milhões de consumidores regulares aos 44 milhões que bebem vinho de forma irregular, temos cerca de 40% da população brasileira.
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Do vinho físico ao digital…
A Grand Cru é uma comercializadora de vinhos de origem argentina. Chegou a terras brasileiras há dezoito anos, e teve seu controle adquirido pelo fundo de private equity Aqua Capital no final de 2014.
A empresa atualmente comercializa 1.800 rótulos, de mais de 200 vinícolas, em uma série de canais de venda: lojas próprias, lojas franqueadas, atendimento a restaurantes e supermercados, comércio eletrônico e clube de assinatura.
Alexandre Bratt, apontado este mês como CEO da Grand Cru, entrou na empresa em novembro de 2019. A meta era digitalizar mais a empresa. “O mercado de vinhos já tinha provado ser fortemente digitalizável. Temos concorrentes que são 100% digitais”, diz Bratt. Em janeiro, a Grand Cru contratou uma nova plataforma de e-commerce, remodelou o clube de assinatura e implementou um sistema de relacionamento com o cliente em todas as lojas (CRM).
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O software se provou essencial para que os vendedores continuassem vendendo a partir de abril de 2020, com lojas e restaurantes fechados. As informações registradas dos consumidores, como contato e vinhos preferidos, facilitaram a abordagem pelo mensageiro WhatsApp. “Os vendedores tinham melhor conhecimento dos clientes, gerando vendas mais efetivas”, diz Bratt.
A empresa também investiu na frente de live commerce – quando o vendedor mostra a loja e realiza a venda em transmissão ao vivo com o cliente. “Lançamos em setembro, pensando em atender aqueles que procuram uma consultoria, mas não podem entrar nas lojas. Ainda não tem uma fatia relevante do nosso faturamento, mas gerou vendas de R$ 1 milhão nesses cerca de três meses de operação”, afirma o CEO da Grand Cru.
As reaberturas de lojas voltaram em outubro, com um novo modelo de franquia. Mais acessível, o formato light pede investimento inicial de R$ 300 mil, ante um mínimo de R$ 800 mil no formato tradicional da Grand Cru. Lojas menores também permitem adentrar praças que não precisam de faturamento agressivo – a última inauguração da Grand Cru foi em Itu, interior de São Paulo.
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Os resultados nas lojas próprias e franqueadas foram colhidos recentemente: as vendas na mesma loja (same store sales) cresceram 25% em novembro de 2019, comparando com o mesmo mês de 2020. A Grand Cru tem 92 lojas atualmente. O plano é agressivo para 2021: abrir entre 35 e 40 pontos de venda, todos franqueados.
Enquanto isso, outros canais se beneficiaram com o isolamento social. O e-commerce agora vende 2,5 vezes mais do que no pré-pandemia, comparando resultados de novembro e de fevereiro. O clube de assinatura alcançou 10 mil assinantes em dezembro, ante 3 mil no começo de 2020.
Esses resultados se relacionam com os estudos da Wine Intelligence, que mostram como a penetração do comércio eletrônico na indústria de vinhos já era conhecida – chegando a 30% entre os consumidores regulares. O Brasil já tem a terceira maior população online compradora de vinhos em termos absolutos (10,6 milhões), perdendo apenas para China (27,3 milhões) e Estados Unidos (19,3 milhões).
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A mencionada participação de 30% de compra virtuais no mercado de vinhos se manteve na pandemia. A empresa de pesquisa de mercado afirma que muitos dos novos consumidores regulares ainda precisam se acostumar a comprar pelo e-commerce.
Bratt diz que o comportamento de compra seguiu os sinais da própria macroeconomia. “No começo da pandemia, entre março e maio, tivemos um aumento na busca por vinhos mais baratos e em promoção. Vemos menos essa busca por oportunidades agora, com os restaurantes reabrindo”, diz o CEO. Já os consumidores de alta renda pararam de viajar e, com isso, de comprar vinhos internacionalmente.
A participação nas vendas das garrafas que custam acima de R$ 1 mil aumentou 78% ao longo do segundo semestre de 2020. Seja por comprar mais ou comprar mais caro, o tíquete médio da Grand Cru terminou este semestre em R$ 1.741, alta de 35,8% sobre o primeiro semestre de 2020.
Durante esse primeiro semestre de 2020, os resultados da Grand Cru ficaram abaixo do projetado no pré-pandemia. Mas o segundo semestre compensou. Em 2020, a Grand Cru já vendeu 4 milhões de garrafas e faturou R$ 235 milhões. Em 2019, havia vendido cerca de 3,8 milhões de garrafas e faturado R$ 220 milhões.
A participação de cada canal mudou, porém. Canais como lojas próprias, lojas franqueadas e vendas para bares e restaurantes (on trade) representavam cerca de 80% do faturamento no primeiro trimestre de 2020. Hoje, respondem por cerca de 56% das vendas. Isso porque as vendas nos supermercados (off trade) representavam 10% do faturamento, e hoje estão em 20%. O canal digital, que inclui e-commerce e assinatura, representava 8% e agora é responsável por 24% do faturamento.
Para 2021, Bratt projeta um equilíbrio entre quatro grandes canais: lojas próprias, lojas franqueadas, digital e vendas B2B (on trade e off trade). Cada um deve ter uma participação entre 20% e 30%. “Vale lembrar que as lojas têm braços digitais, fechando vendas para o clube de assinatura e para o comércio eletrônico. A multiplicidade e integração dos canais é cada vez maior”, diz o CEO da Grand Cru.
A projeção é faturar R$ 310 milhões no próximo ano, alta de 32% sobre 2020.
… E do vinho digital ao físico
O crescimento no consumo de vinhos ao longo deste ano acendeu o alerta de diversos empreendedores. André Picolli, Daniel Skowronsky, Eduardo Glitz, Fernando Kwitko, João Paulo Sattamini, Régis Montagna e Rudimar Pascoal lançaram a Lovin’ Wine em agosto de 2020, no meio da pandemia.
O negócio começou a ser desenhado em janeiro do mesmo ano, com a ideia de simplificar o consumo da bebida. A startup fabrica os próprios vinhos premium branco e rosé e os vende em latas. “A ideia era criar uma embalagem que desse para beber na beira da praia ou da piscina, com ou sem gelo, na lata ou em qualquer copo”, conta Sattamini, que é também CEO da Lovin’ Wine.
As bebidas têm fermentação natural, são levemente gaseificadas e devem ser consumidas geladas. Os vinhos são produzidos no Vale Trentino, na cidade gaúcha Farroupilha, e têm teor alcoólico de 9,5%. A Lovin’ Wine vende para Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo. O pack com quatro latas de 269 mL custa R$ 79,60 (R$ 19,90 por lata).
O modelo de negócio também é focado na simplicidade: fabricação, comercialização, distribuição e marketing estão nas mãos da Lovin’ Wine, que tem seu próprio e-commerce. O formato é conhecido como “marca nativa digital e vertical” (DNVB, na sigla original). O modelo de negócio foi popularizado por marcas americanas como Casper (de colchões) e Warby Parker (de óculos). Por aqui, a varejista de moda Amaro também é uma DNVB.
“Pegamos essa onda de aumento no consumo de vinho. As pessoas deixaram de ir aos bares, e buscaram uma logística mais conveniente e rápida para beber em casa. A lata também tem um tamanho ideal para beber sozinho”, diz Sattamini. “Esse momento no mercado se combinou a um esforço da própria empresa, com trabalho intenso em marketing digital. Focamos no Instagram e em influenciadores digitais.”
A Lovin’ Wine tem um público mais jovem do que a média dos bebedores regulares de vinho. O perfil mais comum de cliente tem entre 25 e 40 anos de idade. Segundo a Wine Intelligence, um dos desafios para o setor é justamente atrair os mais jovens. 59% dos consumidores brasileiros regulares de vinho têm mais de 35 anos de idade. Outra curiosidade da Lovin’ Wine é que 90% dos clientes são mulheres.
De setembro em diante, a Lovin’ Wine teve um crescimento médio mensal de 80%. A startup bateu recorde de vendas em novembro, vendendo 10 mil unidades. No semestre, a startup comercializou mais de 20 mil latas.
O passo mais recente da empresa é ir além da internet. A Lovin’ Wine começou a vender na rede atacadista Sam’s Club em dezembro de 2020. Para Sattamini, físico e online se complementam – especialmente quando as degustações voltarem ao varejo. Enquanto o consumidor precisa comprar packs no e-commerce, pode comprar apenas uma lata fisicamente. “A experimentação é muito importante para o público-alvo conhecer a marca e o produto’, explica o CEO.
“O supermercado também facilita a compra de impulso, porque você não precisa esperar para receber. As próximas compras podem acontecer tanto no ponto de venda quanto digitalmente.”
Em 2021, a Lovin’ Wine espera expandir para outros canais de venda que se beneficiam dos vinhos em lata. Bares, clubes, delivery (pela startup Bebida na Porta), e-commerces, empórios, hotéis, mercados, restaurantes e resorts estão na lista. Também irá lançar novos sabores com base no feedback do cliente nas redes sociais: os vinhos branco seco e rosé seco.
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