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SÃO PAULO – A Black Friday deste ano, que vai acontecer no dia 27 de novembro, última sexta-feira do mês – como já é tradição -, levanta diversas expectativas para o comércio, especialmente para um ano em que o setor foi afetado duramente pela pandemia do coronavírus.
Mas a despeito da crise, o e-commerce conseguiu manter, em certo grau, a demanda pelo consumo de pé, enquanto milhares de lojas físicas fecharam as portas pelo Brasil.
Segundo a Ebit Nielsen, empresa global de medição e análise de dados, as vendas online no país cresceram 47% no primeiro semestre, a maior semestral em duas décadas.
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Nesse contexto, especialistas do setor, dizem que, mais do que nunca, é no e-commerce que o varejo deve apostar suas fichas na Black Friday, que já é a segunda data mais importante do ano para o setor, só atrás do Natal.
“A transformação digital passa a ser um imperativo. E vai além da adoção pura e simples de tecnologia. Com a pandemia, a digitalização se acelerou tanto na perspectiva de quem consome, quanto na perspectiva de quem vende. Não dá mais para o varejo ignorar esse processo”, diz Bianca Dramali, professora de pesquisa e comportamento do consumidor da ESPM do Rio de Janeiro.
Um levantamento enviado em primeira mão ao InfoMoney pela Adyen, processadora holandesa de pagamentos, que atende algumas das maiores varejistas do país, como Magazine Luiza, Via Varejo, Uber e iFood, mostrou que o volume processado pelo varejo físico caiu mais de 80% do começo do ano até agosto, o que evidencia os choques da pandemia no comércio físico.
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No mesmo período, ainda segundo a Adyen, o e-commerce cresceu 60%, impulsionado por um novo perfil de consumidor digital: pessoas que não tinham o hábito de comprar online, mas o adquiriram durante a pandemia.
“Esses novos consumidores são, em sua maioria, pessoas das classes C e D de todas as idades, que aumentaram em 60% o volume de compras online na quarentena. Muitas vezes sem acesso a crédito, o cartão de débito é o principal meio de pagamento escolhido. Por isso vimos muitos negócios se reestruturarem e se reinventarem nesse período”, afirma Jean Mies, presidente da Adyen América Latina.
Black Friday antecipada?
Nos últimos anos as marcas ampliaram a extensão da Black Friday, que em vez de acontecer apenas em um dia, passou a durar uma semana ou até um mês, com várias empresas anunciando descontos durante o mês todo de novembro. Mas neste ano algumas delas resolveram se adiantar ainda mais, iniciando o evento no fim de outubro.
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A Via Varejo (VVAR3), dona de marcas como Ponto Frio e Casas Bahia, anunciou que antecipará a Black Friday “para evitar aglomerações nas lojas e garantir uma venda mais tranquila para os brasileiros em um ano tão complexo”, afirmou Abel Ornelas, COO (diretor de operações) da empresa.
Segundo a varejista, a Black Friday começou na sexta-feira (23) em suas lojas. A empresa prometeu que não haverá flutuação de preços até o final da campanha e disse que as promoções devem durar 40 dias, se estendendo até o final de semana do dia 27 de novembro, data oficial da Black Friday.
Chamada de “Esquenta Black Friday”, a campanha, que já está no ar no site da Casas Bahia, inclui novas promoções a cada 72 horas, frete grátis para compras no aplicativo e pagamento em até 30 vezes sem juros para compras feitas com o cartão Casas Bahia.
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Expectativas e tendências
Segundo a Ebit Nielsen, as vendas através online da Black Friday 2020 devem crescer 27% em comparação com a data de 2019.
Outro levantamento, do Google, também aponta para uma Black Friday 2020 histórica para o e-commerce. O volume de buscas por produtos à venda no buscador já está, desde agosto, em patamares mais elevados do que os registrados durante a Black Friday do ano anterior – o que, segundo a companhia, é um termômetro que indica o forte potencial da edição deste ano.
Em 2019, a semana da Black Friday marcou o pico de buscas do ano no Google em 72% das categorias do varejo. Neste ano, entre 26 de agosto e 22 de setembro, 19 das 29 categorias analisadas pelo Google já registraram um volume de buscas superior à Black Friday de 2019 – ou seja, em 2020 o e-commerce está vivendo semanas e semanas de Black Friday em dias normais.
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“Tem muita gente experimentando a internet pela primeira vez e já há uma intenção de compra muito grande. E o online permite um sortimento maior, fica mais fácil encontrar um produto em um grande e-commerce do que em uma loja física, ainda mais com o tema da saúde em jogo”, explica Julia Rueff, diretora de marketplace do Mercado Livre no Brasil.
Julia ainda conta que, logo no começo da pandemia, o Mercado Livre bateu o volume de vendas da Black Friday do ano passado. “O contexto do e-commerce mudou: antes da pandemia ele tinha 6% de penetração no varejo, hoje já tem quase 11%. Tivemos 2,6 milhões novos usuários em nossa plataforma no Brasil entre abril e maio. No segundo trimestre, o cadastro de vendedores também cresceu 25% sobre o primeiro trimestre”, conta a diretora do Mercado Livre.
A professor da ESPM também ressalta a maior diversificação de produtos comprados pela internet. “Outra tendência para ficarmos de olho é que a Black Friday vai fomentar tanto a demanda de produtos de maior desembolso e desejo, quanto de artigos mais rotineiros e de reposição, já que a compra online passou a permear a jornada dos consumidores nas mais diversas categorias”, diz Bianca.
Black Friday 2020 melhor ou pior que 2019?
Como já é de costume, a Black Friday deve aquecer o comércio. Mas para Michael Viriato, professor de finanças do Insper, neste ano o evento deve trazer um ânimo especial para o setor de varejo, já que as vendas em outras datas comemorativas de 2020, como o Dia das Mães, foram muito fracas por causa da pandemia.
Mas, mesmo com a força do e-commerce, Viriato acha improvável que o evento deste ano supere o do ano passado em números absolutos, considerando o faturamento das vendas online e das lojas físicas.
“Deve-se considerar que a economia foi duramente afetada. Vários preços subiram e a renda caiu. Produtos de alimentação ficaram mais caros e comprometem o orçamento de grande parte das famílias. Adicionalmente, o desemprego está mais alto e a confiança do consumidor está menor”, avalia o professor do Insper.
Ele ressalta que os recordes do e-commerce, especificamente, só serão possíveis pela dinâmica criada pela pandemia. “Os números não serão altos porque o brasileiro vai consumir mais do que ano passado, mas, sim, porque para muitos a venda online é a única forma de consumir’, diz Viriato.
Ainda assim, a diretora do Mercado Livre pondera que a contenção de gastos ao longo do ano pode dar um fôlego à Black Friday 2020. “Existe um sentimento de demanda reprimida, a Black Friday aparece em um momento de abertura, de retomada de alguns serviços e essa demanda reprimida é de compra mesmo. Entendemos que isso deve afetar e impulsionar os números desta edição”, explica Julia.
Filas e lojas lotadas não são mais sinônimos de sucesso
Imagens de pessoas lotando shoppings, filas quilométricas nas portas das lojas e multidões de pessoas carregando sacolas de compras já foram interpretadas como sinal de sucesso de um estabelecimento na Black Friday. Mas em 2020 as mesmas cenas podem gerar sentimento oposto.
Os especialistas destacam que é importante desenhar a experiência física nas lojas da maneira mais cuidadosa possível, no tempo viável que se tem, já que uma ação descuidada pode afetar negativamente a reputação da empresa perante os consumidores brasileiros.
“As marcas precisam estar preparadas para essa procura acima da média e, em situação de pandemia, é essencial um treinamento e a orientação de funcionários, mas só isso não basta. O ambiente de loja precisa ser revisto e adaptado às exigências que uma pandemia nos traz, sem comprometer a experiência de compra”, diz a professora da ESPM.
Para Bianca, ainda que a experiência digital esteja em alta com a pandemia, consumidores mais conservadores não vão abrir mão de visitar o estabelecimento físico, e aí cabe à empresa saber trabalhar com esses dois espaços de venda combinados e fazer o omnichannel [integração entre diversos canais] acontecer para valer.
“Se o lojista enxergar os impeditivos criados pela pandemia como oportunidade, pode até tornar a experiência mais agradável em loja, criando, por exemplo, um sistema de compra digital em loja, no qual o cliente pode selecionar o que quer ver e experimentar por meio de tablets. A loja física pode potencializar a sua função de mídia e ponto de contato para ativação da marca, focando em entretenimento e conteúdo”, completa Bianca.
Mies, presidente da Adyen, também acredita que o canal físico pode complementar a experiência do consumidor no digital. “O comércio contextual é aquele que considera a jornada de usuário como uma só – não interessa se o consumidor está no site do e-commerce, no Instagram ou fazendo uma busca no Google. O consumidor compra algo pela internet, mas escolhe retirar na loja, em vez de receber em casa”, explica.
Descontos podem ser menores neste ano
Teremos descontos menores e menos atrativos na Black Friday 2020? Na visão de Viriato, é possível. Por conta da alta do dólar, muitos varejistas que trabalham com artigos e produtos importados sofreram bastante, já que ficou impossível não repassar a alta dos preços ao consumidor final.
“Os estoques de muitos varejistas, baseados nos preços antigos dos insumos, quando o dólar estava mais baixo, já acabaram, o que impede que o lojista pratique preços menores. Na outra ponta, isso pode frustrar o consumidor, que espera eletroeletrônicos com grandes descontos”, explica o professor do Insper.
Segundo uma pesquisa do comparador de preços Zoom, os preços de alguns artigos eletrônicos chegaram a subir 32% na quarentena, entre fevereiro e junho, como é o caso de videogames, câmeras fotográficas e filmadoras.
Como muitos desses produtos são importados ou têm componentes que vêm de outros países, a alta de cerca de 40% do dólar de janeiro a outubro pesa no preço final.
“A Black Friday vem mais no sentido de limpar o estoque para o fim do ano, e esse estoque já foi, de certa forma, limpo, porque houve uma venda online grande ao longo do ano. Então não dá para dizer que há estoque suficiente para bancar esses descontos. Lojistas ficariam com as margens de lucro mais apertadas do que já estão”, complementa Viriato.
Júlia, do Mercado Livre, concorda que a alta do dólar afeta os preços, mas ressalta que esse aumento não é recente e os lojistas já estão contando com essa variável para pensar nas promoções. Ainda assim, ela concorda que a valorização da moeda americana pode frustrar as expectativas dos consumidores.
“Como o dólar vem em um patamar acima de R$ 5 há alguns meses, os lojistas estão cientes e preparados. Mas não dá para negar que tem um impacto. Precisamos entender que o desconto é sempre sobre o valor real de algo, então não podemos oferecer o mesmo desconto que oferecíamos com o dólar a R$ 3 com a moeda nos patamares atuais”, conta.
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