Texto originalmente enviado aos assinantes da newsletter Stock Pickers em 15 de agosto de 2020
Em 2018, quando Apple e Gradiente disputavam na Justiça brasileira o direito de usar a marca iPhone, tive uma ideia “jenial” de investimento: fazer uma operação long and short com as duas empresas.
A Apple estaria na ponta short, por que, com a perda da marca em um mercado tão relevante quanto o Brasil, certamente sua ação sentiria o baque. Na outra ponta, compraria papéis da Gradiente, pois ganhando uma marca tão valiosa de presente dos tribunais, a empresa brasileira deslancharia.
Entrei no home broker da minha corretora, digitei IGBR3 e comprei os papéis. A liquidez era pouca, mas mesmo assim consegui.
Em seguida, entrei no site da B3 (então BM&FBovespa) para descobrir qual era o código da BDR da Apple. Voltei ao home broker, digitei AAPL34 e… “ativo não encontrado”. Como assim?
Liguei na corretora e disse que o home broker deles estava com problemas, mas fui informado que é assim mesmo, apenas investidores qualificados poderiam comprar ações da Apple.
Argumentei que eu era sim qualificado e que, inclusive, estava naquele momento estruturando uma operação bastante sofisticada. Então fui informado que precisaria ser considerado qualificado não de acordo com meus critérios, mas com os da CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
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E sua instrução 554 define “qualificados” da seguinte maneira:
II – pessoas naturais ou jurídicas que possuam investimentos financeiros em valor superior a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) e que, adicionalmente, atestem por escrito sua condição de investidor qualificado mediante termo próprio, de acordo com o Anexo 9-B;
Como assim? Por norma só quem é milionário pode comprar BDRs da Apple?
Como investidor e cidadão brasileiro portador de um CPF, fiquei me perguntando se essa norma faz sentido. Qual seria a intenção do regulador? Se fosse me proteger de fazer maus negócios com ativos desconhecidos, ela já havia falhado, pois lá estava eu com um belo e totalmente ilíquido lote de IGBR3.
Também me perguntei se o patrimônio investido necessariamente torna alguém mais qualificado para decisões assim. Hoje tenho certeza que não:
Parece mentira, mas não é. Clique aqui e comprove.
Lamentamos informar, caro Leitor, que essa história é fictícia, e a criamos apenas para mostrar uma séria distorção legal.
Hoje a legislação brasileira divide os investidores em classes de acordo com o capital investido. Eles podem ser considerados profissionais (R$ 10 milhões) ou qualificados (R$ 1 milhão). A única maneira de ser considerado qualificado sem ser milionário é obter alguma certificação.
E pelas normas do regulador, alguns tipos de investimentos estão reservados aos qualificados, entre eles os BDRs.
Os BDRs, ou Brazilian Depositary Receipts são ativos brasileiros que equivalem a outros emitidos no exterior.
Na história que contamos, AAPL34 é o BDR equivalente à ação da Apple, negociada na Nasdaq. Na prática, o preço do BDR sobe e desce como o da ação e varia com o câmbio.
Assim o arcabouço legal brasileiro cria uma verdadeira aberração: “protege” seus investidores de comprar BDRs da Apple, Amazon, Google e Netflix, mas permite que caia em verdadeiras roubadas, como comprar papeis sem nenhuma liquidez ou vender seu imóvel para comprar ações do Grupo EBX.
Mas apesar de absurda essa história tem um final feliz. Nos alegramos ao informar que, a partir de 1º de setembro de 2020, essa regra muda e todos nós “desqualificados” (um termo meu, não da CVM) poderemos investir em BDRs.
Agora o investidor não-milionário poderá comprar ações de pesos pesados da tecnologia, da Berkshire Hathaway, a empresa de Warren Buffett, da Harley-Davidson, Disney, Starbucks… A lista tem 553 nomes e você pode vê-la aqui.
Na quarta-feira fizemos uma live com o Mario Palhares, diretor de produtos listados da B3, para entender duas coisas: por que demorou tanto para isso acontecer e como funciona esse mercado em detalhes. Clique aqui para assistir.
Por que isso é tão importante?
Ter ações de empresas listadas em outras bolsas é importante por alguns motivos. Em primeiro lugar, a presença dos líderes do capitalismo global na carteira traz upsides mais que óbvios.
Em segundo, o investidor pode ser defender daquelas crises que são bem brasileiras. Nessa semana mesmo tivemos um solavanco bem verde e amarelo na Bovespa quando o Ministério da Economia perdeu Salim Mattar e Paulo Uebel. Esse tuíte do Salomão vale mais que mil palavras:
O terceiro motivo está no acesso à tecnologia e à inovação. Todas as empresas que protagonizam a quarta revolução industrial estão listadas fora do Brasil, e, como esperado, são as companhias que tiveram maior alta na última década no S&P. Dessa lista abaixo, pelo menos 7 estão intimamente ligadas à tecnologia.
Como você pode perceber, a partir do mês que vem você vai ter muito mais escolhas. Invista com calma, sabedoria e responsabilidade. Prove para a CVM que ela estava errada.
Queime após as 10h
Quem já está no nosso canal do Telegram está recebendo, desde o início da semana, um morning call diferente. É o Queime Após as 10h, nosso boletim diário para você ler antes da abertura da Bolsa.
É rápido e objetivo, feito do nosso jeito: sem frescura e com bom humor. É até estranho chamar de morning call, mas não conhecemos outro termo.
Semana fora da curva
Na semana passada você deve se lembrar que falamos sobre opções, já muitos investidores estavam comprando as da Cogna, que viraram pó. Na terça-feira vamos falar muito mais sobre isso em uma live no nosso canal do YouTube. Inscreva-se e clique no sino.
Não podemos dar spoiler, mas aconselhamos que você não deixe de ouvir o episódio desta quinta-feira. Não vou revelar quem será o convidado, mas adianto que ele é um dos personagens do Fora da Curva 2.
Se você lembra da live com o Martin Escobari, outro personagem desse livro, sabe o nível que a conversa vai ter.
Achou que não ia ter merchan?
Achou errado.
Está com saudades da emoção do circuit breakers, mas não quer mais correr tanto risco? Relembre as emoções da semana mais eletrizante da B3 com a nossa camiseta! Clique e garanta a sua!
Um abraço,
Renato Santiago
Fundador e Apresentador do Stock Pickers
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